sábado, 2 de maio de 2015

Viagem do "Txantxico", um ETAP 28


Nome estranho, galego porventura, mas é como todos os nomes, é nome, e nome de gente, coisa que anda na água e tem alma...
É dum ETAP 28, recém chegado à nossa costa, à Póvoa, a nova "menina dos olhos" do nosso amigo Pedro Reis, fã deste blog e que já há algum tempo sabíamos do seu processo (sempre difícil) de mudança de embarcação (vende-se uma, escolhe-se e compra-se outra, nem sempre por esta ordem...).
Temos a sorte de este nosso amigo e seus companheiros na odisseia, partilharem connosco a sua viagem. Obrigado!
As coisas também são boas porque são partilhadas...
Caros amigos, bons ventos!

Primeiro Acto: a compra

Tendo decidido comprar um veleiro de maiores dimensões, atirei-me à árdua tarefa da escolha... Alguns meses, muitos mapas de excel (alguns amigos me diziam, o barco é como a namorada ..., não há mapas de excel, ou se gosta ou não se gosta!!!) ...mas eu sou assim, que querem? Um dia lá consegui convencer "a mais que tudo" a passar um fim de semana por terras de "nuestros hermanos". Creio que ela já suspeitava de algo!
Num Sábado, incursão a Pobra do Caraminal, falar com a menina que trata da documentação (ainda está a tratar...), dormida na Coruna e Domingo, eis que abalamos para Viveiro onde estava a "criança", "isso é no fim do mundo"..., era o que mais ouvia!
E no fim do mundo lá esperava o veleiro em doca seca. Amor à primeira vista, 30 minutos para fechar o negócio, todas as dificuldades até então, incluindo da viagem, esquecidas! Nova vida vai começar!
Com o "ITB" pronto, faltava trazer a "criança" para casa e para isso, constituir tripulação! Um jantar e ficou tudo definido, metade ia, outra metade não ia... e ainda faltava gente. Como que por magia, numa saída com o amigo Carlos no Orion, conheci o mestre Camilo, que foi requisitado à força....(também não foi preciso fazer tanta força...).
Pedro Reis (Txantxico)
 
Segundo Acto: a Viagem
Depois de algumas reuniões quer à mesa quer ao teclado através de e-mail, ficou constituida a equipa: o Skipper e proprietário da nova e bela embarcação, Pedro Reis, e três ajudantes, Camilo, Álvaro e Carlos.  Quatro tripulantes era um número estratégico, pois possibilitaria navegar sem paragens e sempre com dois elementos no poço de vigia, enquanto os restantes descansavam e comiam… Mas já la vamos!
O Pedro planeou tudo ao detalhe, comida, bebida, para 3 possíveis dias de navegação. O ponto de partida era Viveiro, província de  Lugo na Galiza, a Este da Corunha, distando da Póvoa cerca de 220 milhas. Partimos de carro numa quinta feira ao fim da tarde. O quinto elemento da equipa, Diogo, teve a difícil tarefa de nos levar à marina de Viveiro, 370 km de Vila do Conde.
As previsões mais recentes eram de tempo chuvoso e vento sempre de frente, ou seja, ao modo que íamos rodando o vento connosco rodava e para nos fazer pirraça, batia sempre de proa.
Começou a chover nesse fim de tarde. Chegamos pelas 23:00 h a Viveiro. O Pedro cumpriu as suas obrigações com o vendedor do barco, a equipa tomava conhecimento da embarcação. O senhor José, proprietário do Txantxico (ainda naqueles instantes), deu-nos uma visita guiada e ficou com uma leve esperança que, por causa do tempo frio e chuvoso, ainda ali estivéssemos pela manhã para ver partir o seu companheiro de passeio de muitos anos. Enganou-se...
Reuniu-se o comandante Pedro com a respectiva guarnição, e ficou acertado que se partiria logo após uma ligeira refeição.
Arrancamos pela 1:00H da manhã. A noite estava escura, como todas as noites que não tem sol, nem lua... Chovia bastante. A equipa estava vestida a rigor, fatos impermeáveis, coletes, arneses, e linhas de vida amarradas para quem estava de serviço.
Começou a navegação pelas 2 milhas de canal até ao mar. GPS a funcionar, Maxsea, mais Navionics para fazer redundância e lá se navegou serpenteando a baía. Adeus Viveiro!
A noite foi calma, o vento estava de frente ou era inexistente. Vela grande içada, e por enquanto governava-se sem piloto automático. A manhã acordou escura e chuvosa. Mas a equipa estava motivada, graças ao abastecimento infindável de rissóis e panados, cerveja, bolachas várias e fruta. Ainda houve alguém a dizer mais para o fim da viagem que nunca mais ia comer panados, não por serem maus mas por serem o pequeno almoço, o almoço o lanche e o jantar desses dias. Para contrabalançar, houve os que disseram ter desenvolvido um comportamento aditivo em relação aos rissóis com panrico. Diz-se para os lados de Matosinhos que o Álvaro tem na gaveta do escritório dois pacotes de panrico e uma caixa cheia de panados para aquela fomezinha do meio da manhã…
Se a manhã foi calma o fim de tarde foi atribulado, vento forte, rizo nas velas, ondas e chuva da grossa.
Umas boas milhas antes de Finisterra, passamos a ter o vento de frente outra vez, tendo-se decidido avançar a motor, pois a bolina atirar-nos-ia muito para o largo. Mas ele não ligou... Seria da bateria?  Trocou-se por outra. continuou sem ligar. Recapitularam-se ligações, e tudo continuava na mesma. Até que o Camilo resolveu ver o que se passava na caixa da ignição do poço.
A tarefa valeu-lhe umas boas náuseas, desapertar parafusos, descolar o painel arrancar tudo para ver o que se passava lá atrás. Duas torcidelas, quatro pancadas técnicas e eis que estávamos de novo em “prova”. O Camilo tinha conquistado o nome de o: O-mãozinhas-de-ouro! Tripulação em festa, já nem frio havia, nem chuva nem mesmo ondas, era tudo fantástico e ainda por cima havia panados!
A noite caiu sem fazer barulho, pois mesmo que o fizesse não a ouviríamos, íamos a motor já com a comodidade do piloto-automático. Mesmo agasalhados a noite passava com dificuldade para quem estava de serviço. Os pés e as mãos geladas eram o mais complicado de gerir. Dormir dentro do barco era bom apenas pelo facto de estarmos abrigados e quentes.
 
Na manhã de sábado, pelas 5:30H, navegávamos já ao largo das ilhas Cies. O vento já começava a dar uma ajuda de terra, mas era fraco. Mais umas horas e abrimos a vela da frente para ajudar o motor. Entretanto o vento aumentou, e quando passamos pela Ria de Vigo, o vento de porão não foi mais requisitado.
Pelo fim da manhã e início da tarde passamos Viana, e já se "voava" numa borboleta entre os 6 e 7 nós constantes. Pau de spi na frente, um cabo na retranca para evitar cambadelas de surpresa e lá íamos a grande velocidade para a Póvoa.
 
 
Chegamos ao destino pelas 18:00 H. Ansiosos por um banho e tristes por  abandonar os rissóis, abrimos uma garrafa de champagne, para festejar a boa viagem e desejar ao novo proprietário uma longa vida e longas viagens no Txantxico.
 
Até à próxima aventura!
Carlos Varejão

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